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Denarium avança na privatização da gestão do HGR

A autoridade sanitária do SUS, em Roraima, emitiu uma ata qualificando cinco organizações sociais de saúde (OSS) para terem suas propostas analisadas pelo governo.

Fachada da Secretaria de Estado da Saúde. Foto: Fábio Almeida.

No último dia 05/04/2023, a autoridade sanitária do SUS em Roraima emitiu uma ata qualificando 5 organizações sociais de saúde (OSS) para terem suas propostas analisadas pelo governo. A documentação das empresas privadas, sem fins lucrativos, encontra-se no processo 20101.0345573/2022.20. A proposta de Denarium quer repassar quase R$ 430 milhões para que o parceiro privado administre a contratação de pessoal e serviços, além da aquisição de insumos no único hospital de referência de alta complexidade do Estado.

Conforme a ata da reunião expedida pela comissão especial de seleção, composta pelos servidores Jonathan Silva dos Santos Amaral, Marcelo Freitas Nascimento, Rafael Queiroz da Silva Sena e Helena Martinez Freire Castelo Branco foram classificadas as organizações: Instituto Diretrizes; Instituto Elisedape; SEGEAM; INVS; e IDAB. Porém, os planos de trabalho apresentados encontram-se no processo 20101.024997/2023.67 com acesso restrito a população.

Uma das condicionantes para participar da transferência milionária de recursos públicos era a OSS possuir qualificação como organização social de saúde, no âmbito do Estado de Roraima. O artigo 12, da Lei 1439/2020, transferiu da ALE/RR para o poder executivo a decretação da empresa como organização social de saúde. Mas, as empresas SEGEAM e a INSV solicitaram que apenas o parecer da comissão de análise da solicitação fosse considerado, tendo em vista que o Decreto do governador Denarium não foi publicado a tempo. A proposta foi aceita pelos presentes na reunião.


Um outro questionamento que surgiu no âmbito da reunião foi da empresa Instituto Diretrizes que alertou sobre a abertura do email encaminhado, o procedimento foi realizado 24h antes da data marcada para a realização da reunião. A justificativa, da comissão especial de seleção, para o ato administrativo foi da necessidade de abertura das mensagens em virtude de se averiguar as proponentes que teriam realizado a visita técnica. Ou seja, a SESAU não teve conhecimento oficial das visitas realizadas? As quais aparecem no processo apenas com uma declaração dos representantes legais das empresas selecionadas informando a realização da visita.


A reunião foi suspensa, tendo os participantes do chamamento público até o dia 12/04/2023 para se manifestar quanto a pedidos de impugnação das outras concorrentes. A proposta analisada pela comissão designada para manifestar qual empresa será ganhadora, deveria ter suspendido o edital de chamamento 01/2023, pois o TCE/RR nomeou uma comissão de auditores para apurar denúncias de inconsistência nos estudos técnicos realizados, apontados em matéria publicada pela Amazoom.


A primeira etapa do chamamento público consiste apenas na aferição do cumprimento dos critérios de qualificação, por meio da apresentação dos documentos exigidos pelo edital. Portanto, deverá o governo Denarium neste momento analisar se as informações encaminhadas possuem valor legal e os planos de trabalho cumprem os critérios apresentados no chamamento público. No entanto é fundamental conhecermos cada uma dessas organizações que se predispõe a administrar o HGR

Instituto Diretrizes


A empresa possui o CNPJ 10.946.361/0001-89, sendo sua sede na cidade de Barueri, São Paulo, a abertura da empresa foi realizada no ano de 2006, possuindo como atividade principal o atendimento em pronto-socorro e unidades hospitalares para atendimento de urgências. Sendo presidida pela advogada Katia Pazinato Gregatti, tendo como sócios José Augusto Florenzano Pinto e Marcelo Fernandes da Silva, ambos advogados.


Os dados disponíveis na página da rede mundial de computadores demonstram que a empresa administra contratos de gestão em 4 estabelecimentos de saúde na cidade de Barueri/SP, sendo a maior unidade o pronto atendimento adulto e infantil com 76 leitos. O instituto ainda administra unidades em Sorocaba, Cajamar e Vargem Grande todas em São Paulo. No Pará são geridos hospitais nas cidades de Paragominas, Abaetetuba, Belém e Tucuruí, sendo que nesta última encontra-se a unidade de maior complexidade com um total de 197 leitos.


No ano de 2020 uma CPI realizada no município de Sorocaba, onde a OSS administra as unidades pré-hospitalares da zona oeste e norte, concluiu que a empresa cometeu falsidade ideológica e falsificação de documentos na composição dos conselhos administrativo e fiscal, ao utilizar nomes de pessoas na composição societária que não integravam e conheciam o instituto.


Instituto Elisedape


Registrado sob o CNPJ 24.342.283/0001-18 possui sua sede na cidade de Três Rios, Rio de Janeiro. Sua constituição é do ano de 2016, possuindo como atividade principal atividades de apoio à gestão da saúde, os registros demonstram apenas o nome do presidente da organização o senhor Elias de Albuquerque Lourenço.


A empresa não possui página na internet, apenas no facebook, dificultando acesso as informações no tocante aos contratos de gestão em exercício pelo instituto. Pesquisas realizadas demonstram que no ano de 2017, o MPE do Tocantins recomendou a suspensão do contrato de gestão assinado com o governo daquele Estado para disponibilidade de profissionais de medicina no hospital de Dianópolis, solicitação essa recomendada também pelo CRM/TO.


SEGEAM


A empresa Sustentabilidade, Empreendedorismo e Gestão em Saúde do Amazonas, registrada sob o CNPJ 15.715.984/0001-64, possui sua abertura datada de 15/06/2012, sendo sediada na cidade de Manaus, Amazonas. Na composição societária aparece apenas o nome da presidente, a enfermeira Karina Maria Sabino Cavalcanti de Barros.


As atividades registradas na receita federal consistem em atividades de enfermagem, tendo como registros secundários atividades de consultoria em gestão empresarial, atividades odontológicas, atividades de profissionais da área de saúde e atividades de apoio a gestão. Na página da internet consta que a empresa desenvolve ações de serviços ambulatoriais de enfermagem, inclusive de urgência e emergência.


A associação privada, conforme consta no CNPJ, possui firmado com o governo do Amazonas 25 contratos de gestão para fornecimento de profissionais de enfermagem, não existindo em seu sítio nenhuma demonstração sobre administração de unidades hospitalares, apenas terceirização de mão de obra. Pesquisa realizada demonstrou que existe um histórico de atrasos no pagamentos aos profissionais contratados, o último registro é de janeiro de 2023.


INVS


O Instituto de Saúde Nossa Senhora da Vitória, cujo CNPJ é 13.824.560/0001-02, possui sua sede em Santo Amaro, Bahia. Sua principal atividade econômica consiste em atendimentos em pronto-socorro e unidades hospitalares para atendimento de urgências, suas ações secundárias permeiam um elenco de atividades, inclusive atividades de apoio à educação.


O INSV foi fundado em 1975, consiste em uma associação privada, sendo presidida por Almir Heraclio Adorno Neto, constando apenas o nome dele no registro da pessoa jurídica. A empresa possui um histórico de prestação de serviços de saúde na casa de misericórdia Oliveira de Campinhos, localizada em Santo Amaro.


Além deste estabelecimento de saúde administra Unidades de Pronto Atendimento (UPA) em Salvador/BA, Quissamã/RJ e Guarulhos. Na cidade de Laranjeiras/SE administra o hospital municipal São João de Deus, em Betim/MG um centro materno-infantil, em Nilópolis/RJ o hospital estadual de traumatologia e ortopedia vereador Melchiades Calazans e em Paraíba do Sul o hospital de traumatologia e ortopedia Dona Lindu. Em Quissamã ainda possui um contrato de gestão para administrar o centro de saúde Benedito Pinto das Chagas e o hospital municipal Mariana Maria de Jesus.


O sindicato dos médicos de Minas Gerais (SINMEDMG) em dezembro de 2021 fez uma denúncia em torno da quantidade de profissionais em número inferior a necessidade estabelecida por normatizações do ministério da saúde na preswtação de serviços no Centro Materno Infantil, além da contratação ser efetivada por meio de pejotização, ou seja, o trabalhador é contratado como uma empresa, sem nenhum direito trabalhista.


A proposta de privatização da gestão do HGR, por Denarium, prever que a contratação por pessoa jurídica possa ser efetivada, precarizando as condições de trabalho e deixando os futuros trabalhadores sem a garantia de direitos trabalhistas e aposentadoria. Essa modalidade de contratação foi regulamentada na reforma trabalhista, realizada pelo governo de Michel Temer (MDB), no ano de 2017.


IDAB


O Instituto Diva Alves do Brasil, consiste em uma associação privada cujo CNPJ é 12.955.134/0001-45, fundada em 1988 possui como principal atividade econômica associações de defesa dos direitos humanos. Tendo como ações secundárias um elenco de serviços, incluindo apoio à gestão de saúde. O presidente da empresa é Marcelo Vitor Remor, aparecendo como seus sócios Henrique Ferreira da Costa Gomes e Michele de Castro Silva Protasio, sendo a empresa sediada na cidade de Cacimbinhas, Alagoas.


O endereço eletrônico da empresa demonstra a existência de contratos de gestão em Cacimbinhas/AL para administrar serviços de atendimentos especializados. Em Juazeiro do Norte administra o hospital maternidade São Lucas. As outras parcerias firmadas com o poder público consistem na administração de Unidades de Pronto Atendimento (UPA) nas cidades de Magé, Queimados e Duque de Caxias todas no Rio de Janeiro, além de uma UPA em Juazeiro do Norte.


No ano de 2021 foi publicada uma notícia vinculando casos de corrupção a empresa. As denúncias apresentadas na Câmara de Vereadores extrapolam a malversação dos recursos públicos, chegando a coação de servidores cedidos para prestar serviços na empresa contratada.


Observamos que nenhuma das organizações sociais de saúde qualificadas na primeira etapa do edital de chamamento apresentam conhecimento e expertisse na administração de um estabelecimento de saúde de tamanha complexidade como é o HGR. É importante que as entidades representativas da classe trabalhadora, bem como, os conselhos profissionais do setor da saúde possam avaliar a capacidade técnica destas empresas, a fim de que a população não venha a ser penalizada por inperícia.


Terceirização de serviços


As organizações da sociedade civil são regidas por 2 instrumentos legais as Leis 10.825/2003 e Lei 9.637/1998 conferem o reconhecimento de entidades sem fins lucrativos. Essas organizações podem ter a natureza jurídica de associação privada, fundação privada, organização religiosa e organização social. No Brasil existem, conforme estudo publicado pelo IPEA, em 2023, 815.676 organizações ativas e 345.678 inativas.

As terceirizações das responsabilidades consistem em parcerias pontuais ao desenvolvimento de determinadas etapas de uma política pública. Porém, nos últimos 20 anos esse modelo de gestão cresce principalmente na área de educação e saúde com transferência de milhões de reais para gestão financeira destas empresas. As principais áreas de atuação são: assistência social; cultura e recreação; desenvolvimento e defesa de direitos e interesses; saúde; religião; meio ambiente e proteção animal; educação; e desenvolvimento rural.

Fonte: IPEA

No ano de 2016, um total de 2.646 hospitais no país eram administrados por OSS, ou essas disponibilizavam prestações de serviços, principalmente com a contratação de pessoal. A maior concentração destas terceirizações das gestões e serviços hospitalares se encontra na região sudeste com 45,12% dos contratos de gestão, seguida pela região sul com 26,19%. A região norte apresenta a menor incidência deste tipo de gestão hospitalar representando 4,57%.


Reações

Imagem da petição pública

A sociedade roraimense elaborou uma petição pública endereçada a ALE/RR, MPE, MPF, MPU e ao Conselho Estadual de Sáude de Roraima questionando o modelo de gestão proposto pelo governo de Roraima. A proposição sustenta-se na moção de apoio, aprovada pelo Conselho Nacional de Saúde (CNS), em 21/07/2022, apontando que a terceirização consiste em uma forma de precarização dos serviços de saúde, comprometendo o atendimento à sociedade, além de segmentar o acesso da população mais carente.


As alegações apresentadas no requerimento público apontam os riscos de degradação do trabalho em todas as suas dimensões, desde o desrespeito aos direitos trabalhistas, as más condições de trabalho e baixos salários. Ampliando a vulnerabilidade política dos direitos à saúde da população. Além de não ser apresentado pelo governo de Roraima o impacto sobre o financiamento dos outros estabelecimentos, principalmente do interior, em virtude dos valores a serem destinados a OSS.


Outro argumento apresentado consiste na renúncia pelo Estado de suas obrigações constitucionais, sendo a terceirização na prática uma transferência da responsabilidade social e administrativa para uma empresa, aumentando os riscos de vulnerabilidade e promiscuidade das relações público-privadas, devido as altas somas de recursos públicos a serem transferidos. A transferência da gestão do HGR para uma OSS envolve no primeiro ano um valor de quase R$ 430 milhões, recursos estes não disponíveis ao desenvolvimento das atividades prestadas hoje pelo hospital.

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