Leitura na Infância: importância e benefícios
A criança é um campo aberto para o cultivo de sementes literárias que frutificarão e serão colhidas ao longo de sua vida Por: Kallryn Siqueira A edição mais recente da pesquisa Retratos da Leitura no Brasil realizada pelo Instituto Pró-Livro (IPL) em 2019 e divulgada em 2020, revelou que crianças estão lendo mais que adultos e mostrou a queda da atividade entre adultos e jovens. A pesquisa apontou também que no Brasil há cerca de 100 milhões de leitores, o que representa 52% da população (em 2015 esse percentual era de 56%), destes, 23% são compostos pelo público infantil com idades entre 5 e 10 anos, que leem todos os dias e por vontade própria. O índice aumentou desses pequenos leitores de 67% em 2015 para 71% em 2019, portanto, o maior público leitor do país. Aproveitando o atual cenário da leitura no Brasil e o aumento das distrações na era digitalizada, é importante o incentivo à leitura cada vez mais a esses pequenos que estão em processo de desenvolvimento, que colherão ao longo de suas vidas, os frutos desse hábito positivo. Estímulo ainda na Gravidez Segundo estudos desenvolvidos pelo psiquiatra canadense Thomas Verny, a partir do 3° ou 4° mês de gestação, o feto já ouve o mundo exterior e é capaz de sentir e registrar estímulos sonoros estando ainda no útero. Dessa maneira, cantarolar e fazer leituras para o bebê que está em formação, gera uma memória gestacional afetiva e cria estímulos àquela atividade. Embora nessa tenra idade o feto não desenvolva a cognição, seu subconsciente armazena as informações e percepções sentidas durante o seu crescimento na barriga. Daí a importância de apresentar, ainda no ventre, o mundo das letras através de leituras feitas com voz suave e amorosa. Marcelle Grécia , psicóloga e professora, fala que o estímulo deve ser iniciado ainda durante a gravidez, se comunicando com o bebê na barriga lendo historinhas, veja: Já no mundo exterior, a criança deve ter contato com obras literárias de acordo com sua idade. Um primeiro passo nessa direção são os livros com ilustrações coloridas e de diferentes texturas, que aguçam o lado sensorial conduzindo para uma curiosidade positiva. No primeiro instante, a criança pode ainda não ter desenvolvido a leitura, mas a imagem constrói sentido e significação antes mesma da compreensão textual. Após o ensaio das primeiras palavras, a leitura abrirá um universo vocabular maior e com mais possibilidades para a criança. Seja um vocabulário ativo, aquele grupo de palavras que usamos habitualmente ao falar ou escrever, ou passivo, todo o restante que não é usado, mas que é armazenado e ao lermos ou ouvirmos compreendemos, ajudará no processo cognitivo e emocional na construção de sua personalidade infantil, promovendo segurança e maturidade para a fase adulta. "Para os pequenos, o toque com as mãozinhas e com a boca faz parte do reconhecimento das coisas pelo tato. É claro então que nunca se deve brigar com a criança se ela rasgar uma página ou molhar um livro levando-o à boca. O rasgar é uma apropriação, não é uma destruição. Seu filho, sua filha ou seus aluninhos de creche são mais importantes do que qualquer papel colorido" , Pedro Bandeira. Pedro Bandeira , um dos escritores infanto-juvenis mais lidos do Brasil, falou da necessidade em ajudar os pequenos a criarem gosto pela leitura, aumentando o domínio da compreensão e o favorecimento desse hábito no despontar de suas vidas. “ É preciso que desde muito cedo ajudemos nossas crianças, nossos filhos, os bebês sob nossos cuidados nas creches, a terem um contado frequente com a língua, para que ampliem desde cedo o universo vocabular de que necessitarão para compreender o mundo, para encaixarem-se na vida em uma posição vencedora." A participação de todos nesse processo de incentivo e aprendizado da criança é importantíssima. Na escola, na creche ou em casa, a criança deve ser despertada à leitura pelo prazer, como uma atividade feliz. Pais podem contribuir lendo histórias na hora de dormir ou criar dentro da rotina um tempo para esse exercício em conjunto. Segundo Marcelle Grécia, psicóloga, a criança aprende muito pelo exemplo, por isso um ambiente onde adultos tenham o hábito de ler será motivador para a criança imitar aquela ação. Ainda sobre o trabalho em equipe entre escola, creche e família no incentivo à leitura, Pedro disse: “Vamos ajudar nossas crianças nessa subida, que tem de ser feita degrau por degrau. Não devemos tentar empurrá-los forçadamente, para que logo cheguem ao topo, onde está Baudelaire, Machado de Assis, Shakespeare. Devemos oferecer a eles o conteúdo de cada degrau, com acalantos, com historinhas, com figuras de um livro, com música, com a literatura infantil que tantos escritores como eu procuram criar para esse período do ser humano.” Pandemia e o Novo No auge da pandemia, em 2020, em que a vida de todos foi alterada, Karen Rocha, se viu em casa com sua única filha, na época com cinco anos, em um cotidiano desgastante por falta da rotina escolar. Sua filha, Bianca Rocha, sentiu muito ter a escola retirada do seu dia a dia, e após alguns meses do início do período pandêmico, Karen decidiu colocar Bianca na aula de reforço para, além de aprender, criar uma nova rotina para minimizar o estresse natural vindo com ‘o novo normal'. Bianca foi acompanhada por uma pedagoga que através de várias atividades inseriu a pequena no mundo das letras. E desde então, Bianca, por vontade própria, lê todos os dias. Sua mãe acredita que o fato de ter ido para a creche a partir dos dois anos acelerou o processo de aprendizado da leitura, uma vez que o mundo literário e lúdico já havia sido apresentado a ela desde muito cedo. Após ter aprendido a ler, Bianca pediu que sua mãe lhe comprasse alguns livros, e um foi especial: a bíblia. Hoje com sete anos e cursando o 1° ano do ensino fundamental, Bianca é como as crianças da atual geração que gosta das distrações eletrônicas. Porém, com sua consciência infantil até madura, equilibra o uso da tecnologia com a versatilidade dos livros. Os Benefícios em Longo Prazo A leitura além de nos apresentar diversos mundos em um só, abre para outro ainda mais infinito: o da escrita. No ano de 2010, uma pesquisa divulgada pelo "The Nacional Literancy Trust", Fundo Nacional de Alfabetização do Reino Unido, constatou que crianças que leem com frequência, desenvolvem a escrita melhor do que as que não têm o hábito de ler. Tudo pode começar numa espécie de “diário”, onde a criança registra acontecimentos do cotidiano, externando ali mais que fatos, ações e criatividade, mas seus sentimentos, o que é benéfico. Tal atividade contribui também na sua comunicação oral e na segurança na hora de falar com outras pessoas, sejam adultas ou crianças como ela. Cultivando o hábito da leitura associado ao desenvolvimento da escrita ao longo de sua vida, o ser humano construirá um círculo maior de conhecimento e de relações. Mas, segundo Luís Munaro, graduado em Comunicação e doutor em História, para se desenvolver uma boa escrita é preciso fazer uma seleção da qualidade do que se lê, pois, não necessariamente a quantidade de leitura ditará se o texto é bom, mas uma literatura com solidez. “Uma boa bagagem literária é o ponto de partida para se desenvolver habilidades escritas nas mais variadas áreas”, afirmou Munaro. Portanto, para que haja adultos que escrevam, falem e se comuniquem melhor e sejam senhores de suas emoções, tendo um emocional estruturadamente forte e seguro, é necessário plantar na infância a semente do “querer ler”, pois é nessa fase que a criança se abre ao novo, às descobertas e é a etapa ideal para despertar o desejo das muitas possibilidades que o mundo da leitura oferece. “Esse processo não é só a aquisição do conhecimento racional, é também o desenvolvimento da segurança emocional necessária à vida. E desenvolver as emoções é tarefa das Artes, principalmente da literatura” , concluiu Pedro Bandeira.