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Chegada do período de seca aumenta as chances de incêndios

Atualizado: 21 de out. de 2021

De agosto de 2020 a agosto de 2021 foram registrados 818 focos de incêndio


Fotos: Ana Beatriz


- Por Ana Beatriz Figueira

Muitas queimadas começam com o descarte de lixo na natureza ou a perda do controle das queimadas dos fazendeiros no próprio terreno


As áreas rurais ficam mais propensas a sofrerem com queimadas com a chegada do verão. As fortes ondas de calor e o descaso humano são os motivos mais comuns para que o fogo se alastre e cause incêndios florestais, gerando problemas para muitas pessoas que moram nessas regiões.

O agricultor Cyro Alves já presenciou ocasiões em que as queimadas ficaram descontroladas, atingindo não só seu terreno mas também os outros ao redor. Ele alegou que os ventos fortes na região do Monte Cristo, no norte do estado, fazem com que o fogo se alastre mais rápido pelo mato seco e rasteiro da região.


“Quando eu adquiri o terreno há uns 30 anos, tinha grandes plantações de manga, limão e outros frutos aqui ao redor. Aí chegou o verão, eu não sabia que as queimadas eram tão frequentes, quando dei por mim o fogo tinha tomado conta de tudo, estragando as árvores, o campo. Perdi muitas coisas e não tive mais vontade de plantar nada assim, segui só com a horta e as estufas”, contou.

Ele comenta que durante um dos incêndios, além de destruir as árvores do terreno, as chamas foram tão altas que quase atingiram os fios que levam energia para casa, causando transtorno para toda a família. “A gente viu o fogo chegar perto do disjuntor, a única alternativa foi jogar baldes de água naquela direção, mas a fumaça ardia os olhos. Só de lembrar da fumaça e do fogo, parecia uma cena de terror”.




Para prevenir a recorrência da invasão de queimadas nas terras, o agricultor adotou práticas de isolamento do terreno e contra fogo, porém, ele ressaltou que isso nem sempre resolve a situação emergencial.


“Com o passar dos anos e o excesso de queimadas, aprendemos algumas coisas para evitar o fogo, como o aceiro, que é quando limpamos uma área maior do que 2 metros ao redor do terreno para evitar que o fogo que vem da estrada ou de outros terrenos se alastre. Também fazemos um contra fogo, para impedir que o incêndio chegue em outras áreas, e quando isso não resolve, ligamos para os bombeiros, mas de pouco adianta, porque quando eles chegam, a área já foi queimada”, relatou.

Contexto histórico das queimadas em Roraima


A utilização do fogo para o manejo do solo nas grandes fazendas, com a intenção de criar novos pastos para os animais, é um dos fatores que ocasionam grandes queimadas, que ao saírem de controle podem causar grandes incêndios florestais, como o que atingiu o estado de Roraima em 1998.

Segundo dados do Inpa (Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia), o fogo atingiu cerca de 400 quilômetros de vegetação, destruindo uma área de 11 mil km². Na época, além de estar na estação de seca, os efeitos foram agravados pelo fenômeno natural El Niño, que ocorre quando há o aquecimento das águas do oceano Pacifico e chega ao Brasil, causando chuvas na região Sul e Sudeste e seca no Norte e Nordeste.

O pesquisador e ambientalista, Sewbert Jati, explica que o grande incêndio de 98 ocorreu por uma série de fatores que se combinaram, como uma seca muito forte, que levou a perda da umidade da floresta e consequentemente deixou mais suscetível ao alastramento do fogo, mas o grande problema é que nenhuma lição foi tirada daquele grande incêndio.


“Ano após ano a gente continua queimando cada vez mais. Tanto é que de 98 para cá, a área queimada no estado de Roraima só tem aumentado. Temos uma exploração cada vez maior das florestas, as queimadas ilegais estão cada vez maiores e temos também o crescimento do agronegócio, o que significa menos floresta em pé”, afirmou.


Fotos de queimadas na região do Monte Cristo


Dados recentes do Inpe apontam que de agosto de 2020 a agosto de 2021, Roraima registrou 818 focos de incêndio, destes, 149 estão relacionados ao desmatamento consolidado, a remoção completa da cobertura florestal, e 88 registram a perda da vegetação primária.

“É bom entender que não existe nenhuma forma do ambiente pegar fogo sozinho, então todo fogo que ocorre em qualquer ambiente inicia por conta de que alguém proporcionou esse incêndio de forma direta ou de forma indireta. De forma direta quando a pessoa coloca fogo diretamente e de forma indireta por conta de algum objeto que foi jogado na natureza, como um pedaço de vidro que concentra os raios solares num determinado e inicia um fogo local e o mesmo se espalha”, afirmou Sewbert.

O biólogo aponta ainda que esse excesso de queimadas tem ocasionado alterações na atmosfera que podem ser irreversíveis.



Consequências das queimadas para meio ambiente


A restauração de um ecossistema afetado pelos incêndios florestais pode ocorrer a curto, médio e longo prazo, ou pode não ocorrer, ocasionando a desertificação da área atingida. O professor doutor da Universidade Federal de Roraima (UFRR), Simão Almeida, é pesquisador de representações socioambientais, e explicou que o gás carbônico emitido pelas queimadas acumula-se na atmosfera e provoca efeitos que variam de bioma para bioma.


“Os incêndios liberam gás carbônico que se acumula e perdura na atmosfera, e esse acúmulo pode ser de gás carbônico de anos, até décadas atrás ou emitido na atualidade, que ainda vai se acumular com o que ainda vai ser emitido através dos incêndios. Esses gases acumulados na atmosfera vão provocar alteração na temperatura terrestre e as alterações podem ser diferentes no contexto do bioregional, nacional e global”, explicou.


O acúmulo de gases na atmosfera é responsável por intensificar os efeitos das mudanças climáticas no planeta, aumentando a ocorrência de fenômenos naturais como o El Niño e La Niña, e afetando diretamente no regime de chuvas de uma região, o que influencia nas queimadas, principalmente, na proliferação do fogo.


O professor relatou também que ações humanas mostram-se eficazes para frear esses efeitos das mudanças climáticas. "Quando se trata de queimadas, temos como frear os efeitos não só como provocantes de incêndios, mas também para controlar as chamas. É possível agregar e mobilizar outros para o enfrentamento climático, contra as vulnerabilidades individuais e coletivas, incêndios nos ecossistemas brasileiros e evitar as causas humanas".



Segundo o pesquisador e ambientalista, Sewbert Jati, uma vez que o fogo atinge as florestas, elas tornam-se mais suscetíveis a incendiar novamente, ano após ano.


“A cada vez que a floresta pega fogo, isso vira recorrente, é mais fácil acontecer por conta da diminuição da matéria orgânica que tem nela, especialmente da serrapilheira, aquela camada de folhas que fica embaixo da árvore e que mantém a floresta mais úmida, então ela vai ficando menos úmida e consequentemente mais fácil de pegar fogo de novo”, informou o ambientalista.


Há soluções?



O pesquisador Sewbert apontou que pensar em soluções de larga escala para o problema das queimadas não é fácil. Ele explica que, apesar da Amazônia ter um grande potencial para a criação de créditos de carbono, o Brasil não tem uma política ambiental efetiva.


"Primeiro que o fogo pode ser controlado pelos fazendeiros. Além disso, pode ser substituído por outras tecnologias para limpar o terreno, e essa matéria orgânica também pode ser aproveitada para fazer o plantio da roça, como já vem sendo feito em outras regiões do país. Mas a gente precisa ter uma política ligada à questão ambiental. O Brasil acaba deixando um pouco de lado, apesar de ser cobrado pelo mundo todo”, finalizou.

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