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"O DSEI Leste é do Chico, o DSEI Yanomami é do Messias e ambos são contra os Indígenas de Roraima"

“Entre 2019 e 2020, as indicações nos DSEIs eram de políticos ligados a parlamentares e senadores. Depois passaram a ser de militares e depois, novamente indicações feitas por políticos”, explicou a Repórter Brasil, Luís Ventura Fernandes.

Ilustração de Auá Mendes. Fonte: Repórter Brasil.

A saúde Indígena no Brasil nunca viveu tempos de bonança. Qualquer liderança indígena comprometida com a causa e com o bem-estar do seu povo pode confirmar essa informação. E, também, qualquer um dos milhares de indígenas que precisaram de atendimento (e não obtiveram) nos últimos tempos.


A criação da Secretaria Especial de Saúde Indígena (SASAI) só saiu do papel em 2010. E, embora os Distritos Sanitários Especiais Indígenas (DSEIs) existissem desde o início da década de 1990, subordinados a Fundação Nacional de Saúde (FUNASA), demoraram “funcionar” dentro da nova estrutura.


Em Roraima, foram instaladas duas dessas estruturas: o Distrito Sanitário Especial Indígena Leste (DSEI-L), que “cuida” especialmente da TI Raposa Serra do Sol e das Comunidades Indígenas do Lavrado; e, o Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI-Y), responsável pelos Povos da Floresta.


O estado, que no Brasil é pioneiro na organização dos Povos Indígenas, com a criação do Conselho Indígena de Roraima (CIR) em 1971, de certa forma, também consolidou uma “tendência” na hora da definir quem vai ocupar a coordenação dos Distritos Sanitários locais. Quer saber qual? A pista é: pergunte para o Senador plantão!


O DSEI do Romero


Era 20 maio de 2011 e cerca de 60 indígenas das etnias Yanomami e Ye´kuana já se reuniam em frente a sede da FUNASA, em Boa Vista, para se manifestarem contra a indicação de Andréia Maia Oliveira para a chefia da coordenação do Distrito Sanitário Especial de Saúde Indígena Yanomami (DSEI-Y).


A indicação, na época, foi feita pelo então senador Romero Jucá (MDB-RR), sem consulta prévia às comunidades. O que gerou grande revolta por parte dos indígenas que, por sua vez, já haviam indicado outro nome para o cargo de chefia do DSEI-Y.


Conforme informações publicadas pelo Instituto Sociombiental (ISA), a propósito da indicação do Senador Romero Jucá, a Hutukara Associação Yanomami (HAY), divulgou uma Carta endereçada à Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI), ao Ministério da Saúde, ao presidente da Funai e a outras autoridades governamentais. No documento os Yanomami e Ye'kuana já protestavam contra as indicações políticas para a Saúde Indígena, deixavam claro que não as aceitariam, e relembravam o histórico de desmandos e corrupção na FUNASA já naquele tempo.


Entre os escândalos citados estão duas operações da Polícia Federal de Roraima, uma em 2007 e outra em 2008, contra Marcelo Lopes e Ramiro Teixeira, ambos vinculados à FUNASA e indicados por Romero Jucá. Vale lembrar que, depois, a SESAI sucedeu a FUNASA no atendimento à Saúde Indígena.


O então Senador e seu correligionário, o Deputado Federal Édio Lopes, tamém teriam participado de outras indicações como as de: Rousicler de Jesus Oliveira, no DSEI Yanomami; e, Joseilson Câmara Silva e Armando do Carmo Araújo (Neto ou Armando Neto), que chefiaram o DSEI Leste entre 2015 e 2019.


O DSEI do Messias


Depois disso, o Distrito Sanitário Especial Indígena Yanomami (DSEI-Y) foi liderado, nos últimos anos, por apadrinhados políticos de aliados do ex-presidente Bolsonaro em Roraima. Gente sem atuação prévia em saúde pública e hoje investigadas por corrupção.



Essas figuras eram as responsáveis pela gestão das ações de saúde no território quando começaram, em 2021, os repetidos e intensivos alertas do Poder Judiciário e de entidades indígenas sobre a situação trágica que se observava entre os Yanomami. Alguns desses ex-gestores do DSEI-Y são hoje investigados pelo Ministério Público Federal e pela Polícia Federal por suspeita de fraude e desvio de recursos em uma compra de medicamentos que abasteceria as aldeias Yanomami.


Estão nesse grupo os dois últimos coordenadores do DSEI Yanomami: Rômulo Pinheiro de Freitas, que ocupou o cargo de julho de 2020 a janeiro de 2022, e Ramsés Almeida da Silva, que assumiu o posto na ocasião e ficou até novembro do mesmo ano – quando foi exonerado após operação conjunta entre o MPF e PF que cumpriu 10 mandados de busca e apreensão.


Ao ser nomeado, Ramsés Almeida, por exemplo, tinha como única experiência na vida pública, de acordo com a Procuradoria Federal, o cargo de vereador do município de Mucajaí (RR). Ele, à época na nomeação, era filiado ao partido Republicanos. Segundo apurou o Estadão, ambos eram apadrinhados do senador Mecias de Jesus (Republicanos-RR) e do governador Antonio Denarium (Progressistas), aliados de Bolsonaro no Estado. Os nomes dos coordenadores nem passavam pelo Ministério da Saúde, vinham direto da Casa Civil, comandada no último ano por Ciro Nogueira (Progressistas-PI).


Rômulo Pinheiro foi nomeado para a função em julho de 2020. Durante a gestão dele, houve a denúncia de que servidores do DSEI-Y desviaram vacinas que seriam para indígenas em troca de ouro. À época ele disse que nenhum servidor havia sido afastado das funções.


Em recomendação expedida no dia 30 de novembro de 2022, o MPF em Roraima chegou a pedir intervenção do Ministério da Saúde na administração do DSEI-Y por causa das “graves irregularidades” encontradas na investigação. Ramsés Almeida foi exonerado no dia 22 de novembro, em meio à investigação do MPF. Contrariando recomendação do MPF, o Ministério da Saúde não decretou intervenção no DSEI-Y e o órgão segue sem coordenação definitiva até hoje.


Antes deles, no entanto, em julho de 2019, o major do Exército Francisco Dias Nascimento Filho, foi nomeado para coordenar o DSEI Yanomami – conforme apurado pela Repórter Brasil. De acordo com relatos de indígenas e dos próprios empregados do Distrito, Nascimento ia armado para o local e intimidava funcionários e representantes do Movimento Indígena. Um ano depois, o coordenador perdeu o cargo, por motivos não revelados. A Secretaria Especial de Saúde Indígena (SESAI) informou apenas que ele “foi exonerado pois a SESAI primava pela boa gestão e pelo diálogo permanente com o Controle Social da Saúde Indígena”.


Quem assumiu então, em julho de 2020, foi Rômulo Pinheiro Freitas. Sua gestão também foi alvo de críticas, por falta de transparência e falhas na aplicação de vacinas. De acordo com a Hutukara Associação Yanomami (HAY), além de problemas no planejamento e execução da vacinação pelo DSEI-Y, não foi feita a devida licitação da hora-voo de helicópteros para transportar equipes de saúde e pacientes graves na gestão de Pinheiro.


O DSEI do Chico

Conforme apurou o Repórter Brasil em abril de 2021, além dos militares, diversos apadrinhados políticos ocuparam a Saúde Indígena em Roraima nos últimos quatro anos e contribuíram significativamente para o agravamento da crise sanitária, só reconhecida dois anos depois. Um dos exemplos mais explícitos do aparelhamento por militares e indicados políticos, foi / é o Distrito Sanitário Especial Indígena Leste (DSEI-L).

O DSEI Leste teve cinco coordenadores num período de apenas um ano e oito meses – em meio à pandemia de Covid-19. Um desses indicados, o capitão do Exército Tárcio Alexandre Pimentel, que assumiu a coordenação do DSEI-L em maio de 2020, está sendo investigado pelo Ministério Público Federal de Roraima por ter distribuído indevidamente cloroquina às comunidades indígenas. Além disso, a investigação mira o fato de Pimentel ter autorizado a entrada de pessoas nas aldeias, sem autorização prévia das comunidades.


Dos cinco coordenadores que assumiram o comando do DSEI Leste neste curto período, Pimentel é o único investigado. No entanto, o “padrinho político” do Distrito, o senador Chico Rodrigues (DEM-RR), que foi quem mais indicou nomes para os cargos, não pode dizer o mesmo.


Depois de ter sido pego com R$ 33 mil na cueca em outubro de 2020, Chico Rodrigues é investigado pela Polícia Federal e pelo Tribunal de Contas da União por fornecer equipamentos superfaturados no combate à covid-19 ao DSEI-L, favorecendo empresas comandadas por familiares e aliados. Um avião que já foi de sua propriedade também foi flagrado em um garimpo ilegal dentro de um território indígena.


Em abril de 2019, no início da pandemia, Rodrigues indicou Vitor Paracat Santiago – “uma indicação política clara”, afirmou na época Luís Ventura Fernandes, coordenador do Conselho Indigenista Missionário (CIMI). Apesar dos escândalos, o patrão de Leonardo Rodrigues de Jesus (o Léo Indio) - o sobrinho terrorista de Bolsonaro - seguiu na ativa e teria escolhido pelos menos dois outros coordenadores para o DSEI-L: Adriano de Almeida Corinthi e Charles Barbosa Mendes.


Mendes disse à Repórter Brasil que foi nomeado para o cargo pelo então Ministro da Saúde, Eduardo Pazuello. O mesmo Pazuello que tinha como seu braço direito no Ministério, Airton Antônio Soligo - o Airton Cascavel – nomeado Secretário Estadual da Saúde em maio de 2021, pelo Governador de Roraima Antonio Denarium.


Por último, quem ocupava o cargo de Coordenador Distrital de Saúde Indígena do Distrito Sanitário Especial Indígena – Leste era Marcio Sidney Sousa Cavalcante, que foi exonerado a última sexta-feira (20 de janeiro).


Enquanto você acessa esse material, é possível que os políticos de Roraima e seus aliados - defensores do garimpo ilegal e coparticipes do caos instalado na Saúde - já estejam preparando uma nova ofensiva contra os Povos Indígenas do estado. Porque, para alguns, só a omissão não basta. É preciso sujar as mãos.

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